Roberto da Matta
Uma grande antropóloga inglesa, Mary Douglas, escreveu um livro capital, intitulado Pureza e Perigo. A tese é que quanto mais puro e inocente, mais sujeito a despudores, pecado e sujeira. Há, como sugere Mary Douglas, uma complementaridade entre essas oposições, de tal sorte que quanto mais se salienta um lado, mais o seu contrário adquire força como pano de fundo ameaçador e potencialmente intrusivo.
O povo escolhido é, como o cordeiro de Deus, o mais perseguido. O mais pobre é, como diz a demagogia nacional, o mais honesto: a única categoria que precisa de governo! Claro que temos de descontar os saques realizados pelos "pobres" na ocasião dos terremotos do Haiti e do Chile. Não foi a desigualdade que os promoveu, mas a legitimidade que acoberta o abandono da lei em contextos onde vigora o "salve-se quem puder". Como não há mesmo igualdade, exceto perante a lei, e mesmo assim como forma ideal, todo sistema está sujeito a saque. Quem não se lembra dos "verões quentes" ocorridos em 1964, 65, 66, 67 e 68 em, respectivamente, Nova York, Los Angeles, Cleveland, Newark e Detroit?
Do mesmo modo e pela mesma lógica relacional ou hierárquica, o mais brilhante e generoso é o que mais provoca inveja. O defeito de ter sucesso no Brasil, denunciado por Tom Jobim, é fácil de ser sociologicamente resolvido. Numa sociedade onde tudo tem dono e basta ser filho desta ou daquela família para ter sucesso, os bens já estão divididos. O sucesso que machuca é o êxito inesperado, como o dos jogadores de futebol e o de alguns artistas e intelectuais enviesados que não fazem parte de certas turmas, partidos e patotas.
Se você acha que estou exagerando, leia a história do bíblico José, traído pelos irmãos e vendido a um mercador. Não foi por acaso que ele se transformou num grande decifrador de sonhos, pois quem tem seus sonhos esmagados pelo ressentimento e pela arrogância dos que estão na sala do lado torna-se um especialista em ilusões.
No Brasil, há um elo nítido entre cinismo e canalhice. O larápio dos bens públicos, o bandido que usa o cargo oficial em beneficio próprio e o ocupa para realizar falcatruas; o salteador inominável que, em nome do povo e da igualdade, guarda dinheiro na cueca e na meia, arma esquemas para comprar adversários, diz que não sabia e se escuda no processo eleitoral, difamando-o de modo vil, sente-se ultrajado quando o pegam com a mão na massa. Mesmo quando um filme estampa sua atuação como chefe de uma quadrilha de altos funcionário que, na realidade, são meros larápios dos bens públicos.
Não é difícil responder por que o Brasil tem sido vítima dessa praga. É que o País tem sido uma grande feitoria. O governo geral e a vinda dos Braganças para este lado do mundo foi uma conveniência. Os portugueses jamais governaram, como revela, entre outros, o maldito Eça de Queiroz, igualitariamente. Para o estilo aristocrático e despótico de governo, o governante - e as autoridades em geral - não são sujeitos da lei. Quem faz e vigia o cumprimento das normas não precisa segui-las, diz um axioma do nosso sistema de poder.
Daí o elo espúrio. Ser puro é perigoso e a canalhice não produz vergonha, mas indignação! No Brasil, os roubos mais ofensivos são percebidos pelos seus praticantes como ofensas e calúnias, porque é uma obrigação não escrita roubar o erário e usá-lo a seu bel-prazer. Trata-se de um prêmio pela vitória eleitoral que trouxe ao eleito o Estado como um presente. O ladrão de galinha chora e pede desculpas, mas o ladrão dos recursos que foi encarregado de gerenciar; esse canalha sente-se ofendido e, imitando as grandes figuras políticas do nosso tempo e o próprio Jesus Cristo, diz que perdoa nossas suspeitas porque nós, os seus financiadores, não sabemos o que estamos fazendo! Chegam a rezar agradecendo a Deus pela propina.
A indignação dos ladrões públicos decorre da surpresa de descobrirem-se como sujeitos da lei e da impessoalidade. O famoso "eu não sabia" é revelador da estupefação dos poderosos quando os jornais denunciam que, numa democracia, a impessoalidade é uma decorrência da igualdade de todos perante as regras que não excluem - como ocorre em Cuba e no Irã - ninguém. Dessa impessoalidade como princípio decorre a própria dinâmica dos regimes democráticos, como mostrou, faz tempo, Tocqueville. A indignação dos canalhas e dos que usam e abusam do poder é a contrapartida dialética deste Brasil atual, onde vale tudo e a velha malandragem ultrapassa todos os limites.
Ser puro é perigoso. E ser corrupto e bandido? É ser inocente? Será possível que só existam inocentes no cenário das falcatruas nacionais?
Fico entre o comovido e o derrotado com essa reação indignada dos canalhas que, em seguida, adoecem. Que sociedade curiosa. Eis um sistema no qual o honesto é o merda e o ladrão em nome do povo sente-se ? por mais que roube ? injuriado e ofendido! Será porque ele tira o de todos que, até hoje, não é de ninguém? Será porque ele tem a licença eleitoral de ser o dono desta coisa chamada Brasil, que permanece sendo uma grande feitoria? Temo que sim!
Astronomia, astrofísica, astrogeologia, astrobiologia, astrogeografia. O macro Universo em geral, deixando de lado os assuntos mundanos. Um olhar para o sublime Universo que existe além da Terra e transcende nossas brevíssimas vidas. Astronomy astrophysics, astrogeology, astrobiology, astrogeography. The macro Universe in general, putting aside mundane subjects. A look at the sublime Universe that exists beyond Earth and transcends our rather brief life spans.
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Good fill someone in on and this post helped me alot in my college assignement. Thank you as your information.
ResponderExcluirI am sorry, this variant does not approach me. Who else, what can prompt?
ResponderExcluirU welcome, Dude
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