Confissão do
casal Santana desautoriza a versão de que Dilma é ‘pessoalmente
honesta’
Dilma, quem
diria, logo dará adeus às ilusões. Nas campanhas eleitorais em que se elegeu e
reelegeu graças aos préstimos de João Santana, inventor de patranhas, foi
vendida por ele como a “gerentona” mais habilitada a pôr o País nos eixos e
guiar a classe operária ao paraíso. Acusada de ter cometido crimes funcionais, o
que está para interromper seu mandato, responde pela irresponsabilidade de, por
culpa da roubalheira do partido que a adotou, o PT, ter gerado a quebradeira e o
desemprego generalizados que condenaram a Nação às piores crises ética,
econômica e política da História. E ela ainda se agarra à imagem de ser
“pessoalmente honesta”, que começa a desabar.
Por ironia da
História, uma grave acusação foi feita por esse gênio da lorota de fancaria,
cujo depoimento ao juiz Sergio Moro, da Operação Lava Jato, deu mais uma pista
concreta de que, de fato, a campanha dela, que ele criou, produziu e dirigiu,
foi financiada por dinheiro roubado, de propina de fornecedores da Petrobrás. A
iminente homologação da delação premiada do mágico do marketing, de sua mulher,
contadora e sócia, Mônica Moura, e de muitos executivos da empreiteira
Odebrecht, entre os quais o presidente, Marcelo, prenuncia o fim do refrão com
que Dilma enfrenta o impeachment: não levou vantagem financeira em nada nem tem
conta em banco no exterior.
Para convencer
policiais, procuradores e juiz, o marqueteiro, chamado de Patinhas na juventude
pela fértil originalidade de letrista de música popular, na passagem de sucesso
pelo jornalismo e na maturidade de publicitário milionário, decidiu abrir o bico
como um “canário” da Máfia da Sicília em Chicago. E o faz de maneira cínica,
idêntica à usada para inventar a torpe falsidade de um Brasil irreal de pleno
emprego, redução da pobreza crônica e competente e honesta gestão dos recursos
públicos. Tudo isso foi pago com o fruto do maior assalto desarmado aos cofres
públicos da História, que levou à beira da falência a maior estatal do
País.
Joãozinho
Patinhas teve o desplante de confessar ao juiz que mentiu em depoimento
anterior, após se entregar desembarcando do Caribe, “para não destruir a
Presidência”, uma aparente expressão de lealdade. Mas que, na verdade, continha,
de um lado, o compromisso com a força-tarefa de comprometê-la. E, de outro, a
ameaça de que se dispunha a “cantar”, como um vil delator mafioso, que Dilma
disse desprezar. “Eu, que ajudei de certa maneira a eleição dela, não seria a
pessoa que iria destruir a Presidência, trazer um problema. Nessa época já
iniciava o processo de impeachment, mas ainda não havia nada aberto, e sabia que
isso poderia gerar um grave problema até para o próprio Brasil”,
depôs.
A primeira
versão de “Tucano” (nome da cidade baiana onde ele nasceu, adotado como codinome
nas planilhas do banco de propinas da Odebrecht) não se sustentava nas próprias
pernas: segundo a narrativa, o dinheiro depositado em suas contas teria sido
ganho em campanhas no exterior e o pago pelo PT foi sempre legal.
A história
atual, endossada por Mônica Moura, é mais lógica: em 21 de julho, o casal
admitiu ter recebido no caixa 2 US$ 4,5 milhões para quitar uma dívida da
campanha de Dilma em 2010. Naquela mesma quinta-feira, o engenheiro Zwi
Skornicki, tido pela força-tarefa da Lava Jato como operador de propina do
esquema da Petrobrás (dito petrolão), contou ao juiz Sergio Moro ter depositado,
de 2013 a 2014, em conta do casal no exterior US$ 4,5 milhões para saldar parte
de uma dívida que o PT lhe ficou devendo durante a
campanha.
O valor
coincide, mas não o recurso ao “caixa 2”, conversa mole de estelionatário
confesso, que sempre doura a pílula, tentando desviar a acusação para alguma
infração menor. Assim fazem quaisquer flagrados em crime mais grave. Deixo ao
atento leitor a decisão sobre a quem dar fé: quem pagou ou quem recebeu a
bolada?
Em matéria de
cinismo, marqueteiro e “presidenta” se equivalem. O “Feira” dos registros da
propina da Odebrecht se arvorou a dar lições de contabilidade fora da lei ao
maior especialista em lavagem de dinheiro da Justiça brasileira. Ele disse que
milhares, quiçá milhões, de políticos não prestam contas de campanhas
corretamente à Justiça Eleitoral. Recorreu a metáforas dignas de sua imaginação:
fariam uma fila de Brasília a Manaus, equivalente à Muralha da China, ficando
aptos a ser fotografados por satélite. Seria mais persuasivo se delatasse pelo
menos uma centena dentre os “98%” dos candidatos, que ele considera trapaceiros
como ele.
Os exageros de
João do milhão o qualificam como mestre da patroa em desfaçatez. Terá sido de
sua lavra a explicação que Dilma deu para o fato de, como presidente do Conselho
de Administração da Petrobrás, ter autorizado a compra da refinaria de Pasadena
à Astra Oil? Por que não ocorreu a ela, a conselho de sua protegida Graça
Forster, exigir do ex-diretor internacional, Nestor Cerveró, relatório mais
detalhado tecnicamente do que o que ela definiu como incompleto, antes de
autorizar negócio lesivo ao patrimônio nacional?
Agora recorreu
ao estilo de Lula, ao assegurar no Twitter: “Não autorizei pagamento de caixa 2
a ninguém. Se houve pagamento, não foi com meu conhecimento”. Esse argumento é
fátuo. O professor José Eduardo Martins Cardozo devia ter-lhe ensinado que, no
caso, ela será acusada de ter-se beneficiado do dinheiro ilegal na campanha. À
Rádio França Internacional Dilma disse que, feito dois anos após o pleito, o
repasse não a atinge, omitindo que a propina pagou dívida contraída para a
própria eleição.
A confissão de
Santana, Mônica e Skornicki revela que o mantra profano dos partidos acusados -
o de terem recebido doações legais e aprovadas pelo Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) - é mentiroso. Parte dessas doações se originou de propinas e as tidas
como legais podem ter usado o TSE como lavanderia de dinheiro do
furto.
Jornalista,
poeta e escritor
(Publicado na
Pag.A2 do Estado de S. Paulo na quarta-feira 27 de julho de
2016)
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