José Nêumanne
Cidadão manda
dizer que votará em quem preferir, mas elite dirigente política barganha cargos
públicos pelo apoio a candidatos que quer impor, vício atrasado e nefasto dos
coronéis de antanho
Se as pesquisas
publicadas neste fim de semana forem confirmadas nas urnas domingo, o eleitor
brasileiro terá dado uma grande demonstração de maturidade ao emitir sinais
explícitos de que votará em quem preferir sem seguir cegamente os padrinhos dos
diversos candidatos às prefeituras das grandes cidades. Essa maturidade do
cidadão dá a nosso Estado Democrático de Direito uma força que o liberta de um
dos maiores vícios das democracias frágeis: o curral eleitoral, principal
símbolo do nefasto fisiologismo.
O ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva deixou o segundo governo com um índice espetacular de
popularidade, que não deve ter mudado muito nestes 21 meses fora do poder. Mas
os mesmos institutos de pesquisa que o consagram e dão a sua sucessora, Dilma
Rousseff, recordes de prestígio registram a indigência de índices dos candidatos
que ambos apoiam explicitamente na campanha. É como se o eleitor dissesse:
“gosto de você, mas voto em quem eu bem entender”. Em Recife e Belo Horizonte,
os índices de preferência pelos candidatos petistas desabaram em queda livre. E
tudo indica que em Porto Alegre pela primeira vez um militante do partido da
presidente da República e do governador do Estado nem sequer disputará o segundo
turno.
Em São Paulo, a
aposta pessoal e solitária de Lula, Fernando Haddad, é a esperança solitária de
uma vitória, possível, mas pouco provável, para compensar o mau desempenho nas
outras capitais. Por isso, o ex-presidente fez tanta questão da presença de sua
sucessora no comício de anteontem.
Se o eleitor tem
manifestado estar à altura do amadurecimento da democracia, o mesmo não se pode
dizer da elite dirigente, a começar pelos governantes socialistas, de que a
participação da presidente na eleição municipal paulistana é o pior exemplo.
Antes, ela nomeou o malufista Osvaldo Garcia para conquistar um minuto e meio na
televisão para Haddad. Depois, dobrou a resistência da senadora Marta Suplicy
(PT-SP) que trocou suas mágoas de preterida pelo Ministério da
Cultura.
Numa democracia,
não é o caso de estranhar a presença de qualquer executivo público no palanque
de seu candidato. Dilma tem o mesmo direito de fazer campanha para Haddad como
Alckmin e Kassab o têm para pedir votos para José Serra. O que ela não podia (ou
melhor não devia) era utilizar cargos da administração pública federal como
moeda de troca de apoio para levar um correligionário à vitória nas urnas. Este
comportamento traz de volta os hábitos mais nefandos da velha política dos
coronéis de antanho. Enquanto o cidadão contribui para o avanço da democracia,
os políticos ainda investem no atraso.
Jornalista,
escritor e editorialista do Jornal da Tarde
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