Eu escrevi o teu nome onde não tinhas mais como saber
sua origem.
O dia
enfiado na goela da miragem e eu esquadrinhando as ruas que passavam por meu
sonho.
A imensa
boca aberta precipitada sobre a paisagem recordada no cartão postal, como se não
houvesse mais nada além da perda daquela memória em nossas
vidas.
Teu
corpo rascunhando dez epílogos possíveis para o sol que há muito havia sido
sacrificado.
Somente
um louco refaria nosso mundo.
Com
tantos deuses empilhados à porta de teu ventre não haveria sequer como enxotar
dali seus fantasmas.
Um saque
de cada vez: metas para o novo milênio corrompido.
Os
metais inflamados, as vantagens refeitas, um cofre lacrado com o segredo das
moléculas e das metáforas, pequenas fábulas ardilosas como o santo sudário, eu
ainda me arrisco a desvendar o paradeiro de teus
lábios.
O amor
costumava ser a única catástrofe que, uma vez emborcada, podia converter-se em
outra fonte de milagres.
Quando
os milagres perderam cotação no mercado, o amor não soube mais o que fazer de
si.
Desde
então o homem é um acidente boiando entre
parábolas.
Escavando bem talvez se recupere o desenlace de algum
abismo.
O olho
mágico encontrado em um antiquário como um catálogo de
extravios.
Os
disfarces sempre foram a dieta sagrada de todas as
bestas.
As novas
formas atribuídas a uma maçante repetição do mecanismo das
quedas.
A
monotonia da exasperação pela velocidade, o fastio ante o deslumbre de um mundo
que expande a letra e sintetiza o espírito.
Os teus
versos foram ficando gastos, a luz coberta de ferrugem, como uma língua
putrefata viciada em suas pequenas
impossibilidades.
De todas
as formas de vida que necrosam em uma enfermaria fora de alcance de qualquer
radar, nenhuma é mais patética do que a tua.
O
espelho é uma espécie de estropício da alma danada.
Não
sobra nada por onde ele passa.
Foi
impossível localizar Deus para questionar sua responsabilidade sobre as avarias
manuscritas às pressas nas páginas finais dos livros de
bordo.
Há
edições romanceadas de todos os prejuízos.
__________________________________________________
poema &
fotografia | FLORIANO
MARTINS
Nenhum comentário:
Postar um comentário