José Nêumanne
De direita ou de esquerda, no governo ou na oposição, gestores públicos sempre acham que votos lhes dão carta branca para destinar o dinheiro de todos para ajudar amigos e aliados
A Prefeitura de São Paulo encontrou uma maneira engenhosa de fazer o jogo de retaliação do presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, comandante da organização da Copa do Mundo da Fifa no Brasil em 2014 e, com isso, ainda beneficiar o time de maior torcida na cidade, o Corinthians. O jeitinho paulistano de dar circo à massa é tirar um naco de pão de cada cidadão e ceder R$ 420 milhões em isenção de impostos (vulgo “benefícios fiscais”) para gerar renda suficiente para o alvinegro do Parque São Jorge se mudar para Itaquera, construir o estádio onde serão disputados os jogos do Mundial na maior cidade do País e agregar ao patrimônio imobiliário uma obra que não teve competência, ao longo de toda a sua existência, para erigir com recursos próprios. Danem-se São Paulo, Palmeiras e Santos, que construíram os seus sem ajuda pública!
O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) financiará a associação entre as redes de supermercados Pão de Açúcar, brasileira, e Carrefour, francesa, com um aporte de dez vezes o dinheiro a ser gasto para construir o local onde poderá ser jogada a abertura do mais importante torneio de futebol do planeta. É dinheiro de impostos que poderia ser aplicado na construção de hospitais e escolas, manutenção de estradas, novos presídios para aliviar o inferno da população carcerária ou reforma de aeroportos para evitar o Caos Aéreo anunciado, mas será empregado para evitar que o grupo francês Casino assuma o controle acionário de supermercados brasileiros.
As duas decisões foram tomadas por instâncias diferentes do poder público e por gestores públicos com orientações políticas opostas. O prefeito Gilberto Kassab dedicou sua carreira inteira à pregação e à prática do liberalismo. A presidente Dilma Rousseff pegou em armas para substituir uma ditadura militar de direita por outra militante de esquerda. Mas, consideradas as diferenças de objetivo e valor, ambos têm idêntico vezo em relação aos recursos que seus fiscais cobram.
De esquerda ou de direita, no governo ou na oposição, os profissionais da política tendem a acreditar que recebem nas urnas carta branca para destinar dinheiro tirado do bolso de todos para objetivos que digam respeito a interesses pessoais, familiares, grupais ou partidários. Nós conhecemos as desculpas dadas pelos governos federal brasileiro e municipal paulistano para explicarem a injustificável destinação de recursos originados de todos para os bolsos de alguns - seja o time da massa, seja o proprietário das gôndolas. A palavra de ordem é arrecadar de todos para usufruto de poucos - amigos e aliados, é óbvio.
Jornalista, escritor e editorialista do Jornal da Tarde
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