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quarta-feira, 21 de julho de 2010

Um Furacão Chamado Simonal

João Francisco Neto
Hoje pouca gente sabe, e os que sabem não se lembram mais: no Brasil, um dos primeiros pop stars, verdadeiramente dignos desse nome, chamava-se Wilson Simonal.
Simonal, negro, pobre e nascido no subúrbio carioca, praticamente dominou a cena pop dos anos 1960 e princípio dos 70. Com sua bela voz, transitava por vários ritmos: jazz, bossa-nova, samba, canções românticas, etc. Era muito bem relacionado, e o seu variado círculo de amizades alcançava gente como Elis Regina, Caetano Veloso, Chico Buarque, César Camargo Mariano, Ronaldo Bôscoli, Vinícius de Moraes, e tantos outros. Chegou a fazer um dueto, em inglês, com a cantora americana de jazz Sarah Vaughan, para a inveja geral, pois ela era muito exigente e não gostava de compartilhar o palco com qualquer cantor.
Simonal foi responsável por um grande número de sucessos que realmente caíram na boca do povo. No auge da carreira, apresentou-se no Maracanãzinho, onde regeu um coro de milhares de pessoas que cantavam o hit “País Tropical”. Além disso, foi o primeiro artista brasileiro a fechar um grande contrato de publicidade com uma das maiores multinacionais do mundo (a Shell). E isso não era pouca coisa não, pois Simonal dividia espaço na mídia com os ídolos da Jovem Guarda, do Tropicalismo, da Bossa Nova e da MPB.
Simonal era isso aí: negro e suburbano, mas circulava com naturalidade pela elegante Zona Sul carioca; tinha talento, bela voz, charme, belas mulheres, dinheiro, popularidade, carisma, prestígio, simpatia e muita, mas muita irreverência, mesmo. Chico Anísio costumava dizer que Simonal não se sentia o rei da cocada preta: ele era o próprio rei da cocada preta!
Mas, por tudo isso haveria de pagar um preço altíssimo. Em 1971, em plena ditadura militar, foi acusado de ser colaborador das forças de repressão. Segundo os seus detratores, Simonal seria um informante, que entregava os artistas contrários ao regime político da época.
Essa acusação, que nunca foi provada, espalhou-se como rastilho de pólvora, e Simonal afundou, para sempre, num turbilhão de inveja e maldade, que vinha de todos os lados. Ninguém sabia quem eram os seus acusadores, mas Simonal viu todas as portas se fecharem para ele: gravadoras, emissoras de TV, rádios, jornais, revistas, teatros, compositores, antigos parceiros musicais, enfim, todos passaram a ignorá-lo, como se ele jamais tivesse existido.
Embora vivo, Simonal estava morto para a vida artística; e assim foi até que o dia em que realmente morreu, no ano 2000, mergulhado na amargura da solidão, do alcoolismo e do ressentimento.
Há pouco, iniciou-se um movimento para recuperar a imagem de Simonal. Em 2009 foi lançado um belo documentário (“Ninguém Sabe o Duro que Dei”), que relata a trajetória desse grande cantor, vítima de uma monumental injustiça, que perdura até nossos dias, pois Simonal ainda tem poderosos inimigos, muito bem posicionados no meio cultural.
Com esse documentário, as novas gerações poderão, enfim, conhecer uma pequena parte do furacão de simpatia e charme que foi Wilson Simonal. A propósito, seus dois filhos cantores, Max de Castro e Simoninha, embora talentosos, não são nem uma pálida sombra do que foi o pai. João Francisco Neto é Fiscal da Fazenda de SP, mestre e doutor em Direito Econômico e Financeiro pela Faculdade de Direito da USP.
jfrancis@usp.br
Como comentei com o autor, que concodou comigo, o grande Simonal foi vítima das circunstâncias, lembrando a atualidade de José Ortega y Gasset "Eu sou eu e minhas circunstâncias".

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