Dilma exibe
vexames de seu governo em Paris e oposição os esconde sem sair de
Brasília
Em seis minutos,
quando você houver terminado de ler este texto, 12 brasileiros terão perdido o
seu emprego: um a cada dois minutos. Será difícil achar outro. Quem encontrar
dificilmente será com um salário semelhante. Mas isso não é problema para a
sempre “extremamente preocupada, estarrecida e muito chateada” da República
Dilma Rousseff, que viajou na sexta-feira e está de volta após ter participado
da Cúpula do Clima em Paris, para onde Barack Obama só foi no
domingo.
Que Deus nos
acuda! Nosso clima agora não é favorável – do Oiapoque ao Chuí. A sinistra do
Meio Ambiente, Isabella Teixeira, que ficará na Europa duas semanas, na chefia
da delegação brasileira nas negociações da mudança climática, informou há 15
dias que o desmatamento na Amazônia aumentou 16% de agosto de 2014 a julho
último, longe da meta zero anunciada. Nunca no Brasil governo algum tomou a
única atitude para pôr fim ao desmate da floresta tropical: simplesmente
proibi-lo. Mas Dilma foi aquém ao cortar 72% das verbas programadas para
combatê-lo. Com a Hileia em chamas, diz candidamente Isabella que a defesa do
ecossistema não depende só de sua presença aqui. Enquanto isso, ardem reservas
florestais no interior da Bahia.
Domingo, Dilma
reuniu-se, antes de começar a 21.ª Conferência das Nações Unidas sobre Condições
Climáticas (COP-21), com os chefes de governo do Equador e da Noruega. Será que
tentou convencê-los a transpor neve dos Andes e água dos fiordes noruegueses
para o semiárido? Lá ocorre a maior seca em 50 anos, sem que jamais ela haja
visitado a região, nem que fosse apenas para confortar sertanejos morrendo de
sede. Os reservatórios de água das grandes cidades nordestinas estão
praticamente vazios e a única providência tomada por seu governo foi incluir nos
anúncios do Partido dos Trabalhadores (PT) na televisão depoimentos de vítimas
da estiagem manifestando sua esperança na transposição do Rio São Francisco,
obra faraônica que virou esfinge inconclusa em ruínas.
A presidente só
foi ao Vale do Rio Doce uma semana após a tragédia da ruptura da barragem de
contenção de rejeitos da mineradora Samarco, um dos maiores desastres ambientais
da História. Assim mesmo, manteve a tradição de não pôr o pezinho na lama
tóxica. A participação do Brasil na COP-21 foi vergonhosa como a avalanche de
mentiras que a candidata à reeleição desencadeou na campanha de 2014. A
diferença é que, no ano passado, ela mentiu em português tatibitate, enquanto em
Paris balelas como a cobrança de R$ 20 bilhões de multas pelo Ibama tiveram
tradução simultânea para muitos idiomas. Os meios de comunicação já se tinham
encarregado de contar a verdade em línguas suficientes.
Não dá para
levar a sério um governo que nunca tomou nenhuma providência para evitar a
trágica imprevidência da mineradora, na qual a União tem relevante participação
acionária. E ninguém está disposto a relevar essa falha só porque antes nenhum
outro governo também nunca fiscalizou alguém. A tragédia ambiental e humana é de
tal monta que qualquer desculpa esfarrapada, a esta altura, deixa de ser cínica
para virar um escárnio – tomando emprestada a magnífica metáfora usada pela
ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao votar pela
permissão da prisão, pela Polícia Federal, do líder do governo no Senado,
Delcídio “do” Amaral (PT-MS).
A onda de lama
contaminada que desceu da cidade histórica de Mariana, em Minas, até o mar do
Espírito Santo (que não nos valeu!) foi mais do que uma evidência da vergonha
que o Brasil passaria em Le Bourget com o descaramento destrambelhado da
desabilitada gestora desta República. A tragédia que destruiu vidas, vilas e
campos às margens do Rio Doce é também a metáfora mais exata dos vexames que têm
paralisado o País com a revelação da roubalheira devassada na Operação Lava
Jato.
Preso
na véspera o amigo de Lula que tinha licença do ex para entrar em seu gabinete
sem ser anunciado, o 25 de novembro entrou para a História com a prisão do líder
do governo no Senado, por ter planejado a fuga do ex-diretor internacional da
Petrobrás Nestor Cerveró para não ser delatado por ele. O PT abandonou-o em nota
alegando que ele não cumpria tarefa partidária, igual desculpa do Palácio do
Planalto para evitar se sujar na lama que invadiu seu lago na entrada, onde nem
os patinhos nadam em paz.
Delcídio (na
etimologia, assassínio de Deus) só podia, então, estar a serviço do Menino
Jesus, cujo aniversário se celebrará em menos de um mês e era frequentemente
citado em suas pias mensagens em redes sociais. Essa hipótese seria reforçada
pela desculpa de que sua decisão de doar R$ 50 mil (sendo seu salário de R$ 33
mil) por mês ao ex-subordinado Cerveró fora por “razões humanitárias”. Só isso
talvez merecesse a canonização do ex-diretor da Petrobrás, ex-tucano e
concorrente de Irmã Dulce e de Madre Tereza de Calcutá.
Os votos
unânimes da 2.ª Turma do STF foram históricos. Mais histórica ainda foi a sessão
noturna na qual, entre lamentos e feições soturnas, os senadores abriram a
votação (52 a 19) e confirmaram a prisão do colega (59 a 13), contrariando
desesperados apelos do presidente Renan Calheiros (PMDB-AL). Como no verso
célebre de John Donne, os insignes anciãos (Senado vem do latim senior)
sabiam que os sinos da opinião pública não dobravam por Delcídio, mas por todos
quantos a ele se associaram na doce ilusão da impunidade, ora em extinção. Tudo
sob o silêncio funéreo de opositores que, por falta de inteligência, vergonha ou
por rabo de palha, sob a liderança do amigo oculto Aécio Neves (PSDB-MG), se
juntaram ao chororô cuspindo para cima sem cuidar da lei da
gravidade.
Da última semana
de fortes emoções ficou ao menos a esperança de essa lama tóxica da política nos
levar ao pleno Estado de Direito, no qual todos são mesmo iguais perante a
lei.
Jornalista,
poeta e escritor
(Publicado
na Pag.A2 do Estado de S. Paulo da quarta-feira 2 de dezembro de
2015)
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