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sábado, 17 de março de 2007

Sou apenas o vento sob suas asas

Dois monges estavam a discutir se uma bandeira tremulando ao vento se movimentava, ou se era o poste que o fazia. Um terceiro monge aproximou-se e disse: “Não é a bandeira que se mexe, tampouco o poste; são as vossas dignas mentes que se movimentam” Talvez a coisa mais fascinante nas relações humanas seja a afinidade. Há uma espécie de celebração quando duas pessoas se identificam, no mais das vezes, por obra do acaso, porque ninguém sai planejando algo como “vou encontrar alguém assim, assim, à tal hora e em tal lugar”. Uma ação trivial, simples, rotineira, pode nos conduzir ao encontro de alguém que será nosso amigo; como se tal evento já estivesse escrito nas estrelas, definido pelos estranhos estratagemas do destino. Não há escolha e não há como impedir; já que nada controlamos em nossas vidas, além de nossas ações – quando não nos deixamos levar pela ira ou outra emoção exacerbada. Seriam estes acontecimentos meros encontros casuais ou reencontros? Tentando não complicar os pensamentos, torna-se irresistível lançar a pergunta: é possível imaginar-se “um dia sem ontem?” Nós morremos, é fato; estrelas morrem, planetas se extinguem. Mas também é certo que na natureza nada se perde, tudo se transforma. Assim, quando partimos, por assim dizer, talvez estejamos, apenas, sofrendo um processo de transformação, nada diferente daquilo que nos ocorre durante toda a vida. Ao nos transformarmos em “algo diferente”, ou algo mais, talvez nos encontremos novamente com estas pessoas com as quais nos identificamos de maneira insofismável, arrebatadora. E voltemos para cá, tornando a vê-las, mais uma vez, num ciclo talvez interminável. E até por desafiar a lei das probabilidades, este encontro, num mundo de seis bilhões de habitantes, parece mesmo algo previamente combinado, ou designado, e também um presente da vida. Tanto faz se é amizade ou uma relação marital, se é heterossexual ou homossexual; tudo se resume a uma única coisa, o amor. Amizade é amor, namoro é amor. Não há, como se pensa, esta coisa de amor de mãe, ou fraterno, ou de homem-mulher. Este sentimento singular que acompanha a afinidade é um só. E não varia em intensidade: ou é, ou não é. Não acaba nunca, porque se acabar um dia, não era amor, tampouco afinidade. E quando estamos próximos a estas pessoas, sentimo-nos confortavelmente tranqüilos, confiantes e dispostos a dar-lhes muito de nós mesmos. Conversamos, concordamos e divergimos, sempre com respeito pela opinião do outro, sem tentarmos impor a nossa. Porque apesar da afinidade, as pessoas são diferentes, únicas, e é isto que faz a vida maravilhosa e lhe dá sentido. Raramente necessitamos pedir ajuda a estes amigos; se eles sabem de nossas dificuldades, prontificam-se a nos ajudar, a nos conduzir e ensinar-nos aquilo que dominam com sabedoria. Ainda que fiquemos anos sem vermos estas amizades especiais, quando se dá um reencontro, é como se não houvesse passado tempo algum. Porque certas coisas são mesmo atemporais, guardam um quê de eternidade. E quando eles nos vêm com aquela ajuda providencial e desinteressada e nós lhes agradecemos, eles respondem: “sou apenas o vento sob suas asas”. Frente a uma despedida que se faz necessária, dizem assim: “Por mais longe que estejamos um do outro, nunca será tão longe que as pontas das nossas asas não se possam tocar”.

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