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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Se tudo vai mal, logo...




Roberto DaMatta


A lógica nacional sempre foi sensata. Ela rezava assim: se tudo vai mal e, se o Brasil também vai mal, então tudo vai bem. Este princípio – hoje em suspeição – permeia o nosso pensamento. Está tão dentro de nós quanto o melado que nos lambuza. Prestigiado, ele foi encampado pela esquerda como um valor. O roubo dos outros, vociferam, legitima o nosso. Ademais, roubar aquilo que seria de todos para ajudar os pobres não é safadagem porque, até o advento desta desagradável era de transparência e de liberalismo golpista, o que era de todos, não era de ninguém.
Pertencia aos que "subiam" e controlavam a "república". Aliás, devo lembrar o nosso desgosto por tudo o que é "re-pública" (coisa pública), pois sendo mais filhos de família do que cidadãos, temos horror a impessoalidade e ao aononimato, esses irmãos da igualdade. No país das celebridades e dos queridinhos, todo mundo quer, além da conta bancaria na Suiça, uma coleção de carros de luxo ou um quarto secreto cheio de quadros tão falsos quanto o dono. Roubar para ostentar é um ato falho do nosso inconsciente aristocrático.
O de "todos" é negativo. Ou alguém vai casar com uma "mulher publica"? Não estaria ai o temor que, ao lado do nosso machismo, afasta as mulheres da politica?
O fato é que a indiferença a "tudo que é de todos" define o que nós, brasileiros, entendemos por "política". Para nós, a política é o túmulo do que não gostamos. Como nada temos a ver com ela, tudo o que diz respeito ao gerenciamento público é entregue aos políticos que fazem o que bem entendem, desde que atendam aos nossos pleitos. Ou não nos perturbem com muitos deveres e impostos.
Enquanto isso, nós jogamos o nosso lixo na rua certos de que cabe ao "governo" resolver o assunto mas a maldita "política" não deixa. Tudo vai bem até o dia em que descobrimos que o descaso em massa, ao lado de incompetência administrativa e da má-fé ideológica, levam o País à ruína.
E se países não são empresas, eles só prestam quando gastam menos do que arrecadam. Mas se a nossa utopia é todo mundo virar funcionário público, bolsista ou aposentado e, como prêmio, todo "político" ter o direito de roubar sem ser punido então o Brasil vai pró brejo!
E se ele não é de ninguém, hoje nós temos certeza que ele não pode mais ser de Lula, do PT, da dona Dilma e do lambuzado Jacques Wagner.
Há uma cadeia. A indiferença que é o maior fosso entre o estado e a sociedade começa a acabar quando o colapso da saúde, da segurança e da educação viram calamidades. Ao lado das catástrofes climáticas e dos abismos sociais ainda puerilmente tratados como dependentes de "vontade política" e não de uma moralidade engendrada pela escravidão negra, comandada por uma aristocracia branca entramos no vermelho.
Mas se somarmos a tudo isso incompetência e a roubalheira temos o nó de porco perfeito.
O que me intriga, porém, não é somente o roubo; é achar que há roubo de direita e roubo de esquerda. O primeiro é errado, o segundo é certo. Curiosa essa inversão carnavalesca já anunciada quando o lider do partido e um dos que mais lucrou com a ladroagem – Lula, o probo – desafia-nos publicamente afirmando que não há "viva-alma" mais honesta que ele. Só mesmo pensando no Carnaval, pode-se ouvir essa bazófia de um sujeito capaz de desconstruir-se com tanta competência.
Eis o operário pobre que virou o presidente mais amigo dos ricos da história deste país. E não satisfeito com essa mascarada, deu aos seus novos amigos mais que dinheiro, pois num feito digno de sua patológica onipotência, entregou-lhes o Brasil. Para tanto, tornou-se um misto de presidente-garoto-propaganda e criou uma rede de favores nacionais e internacionais com todo tipo de gente, preferencialmente, com pluto-kleptocratas. Seu governo criou uma imensa e incompetente máquina estatal voltada para a reação anti-igualitária, com o devido abandono dos idiotas que por amor, esperança, honestidade, ideologia e utopia, o elegeram. Voltado para o poder do dinheiro, o lulo-petismo fabricou uma nova elite e um novo discurso não mais baseado no velho marxismo libertador da guerra fria, mas num populismo de massa unipartidário capaz de comprar legislação e legisladores no que se transformou na mais grave roubalheira da historia do capitalismo: o assalto que arruinou a Petrobrás.
A parceria de um partido dito revolucionário com setores tradicionais do empresariado, resultou em ganhos eleitorais, num fardo impossível de administrar e num incrível embaralhamento institucional. Hoje, ser de esquerda é impedir o funcinamento da Justiça. Hoje, buscar o rumo, é ser golpista.
Criamos mais um brasileirismo: o "capitalismo de esquerda". Aquele que rouba e não faz. Ao fim e ao cabo quem paga somos nós. Mas como tais arranjos ocorrem em toda parte e, além disso, como disse a presidenta, todo mundo erra, se tudo vai mal, logo...

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