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domingo, 15 de abril de 2007

COALAS & EUCALIPTOS

Não fossem as grandes orelhas, os coalas pareceriam pequenos ursos cinzentos e felpudos, tão atraentes quanto seus similares de pelúcia। Eles, no entanto, pertencem à família dos marsupiais (a mesma dos cangurus), e vivem numa Ilha – por sinal, também denominada de Canguru, na costa sul da Austrália – alimentando-se exclusivamente de folhas de algumas espécies de eucalipto। Os coalas não são nativos daquela ilha, que fica a cerca de 120 quilômetros a sudeste de Adelaide, mas foram trazidos do continente australiano e introduzidos lá por gerações de colonizadores europeus.
Em 2004, no entanto, 28.000 coalas da ilha estavam ameaçados de morte em função da escassez crescente de sua alimentação única – as folhas de eucalipto – e alguns especialistas em meio ambiente chegaram até a sugerir a matança deles para que os demais pudessem sobreviver (e quase foram mortos por conta disso!). Um programa de controle populacional, porém, através do uso de anti-conceptivos subcutâneos e orais, permitiu um controle adequado das populações de coalas na Ilha de Canguru e hoje eles já não figuram mais entre as espécies animais ameaçadas de iminente extinção. Mas, existe uma curiosidade a respeito dos coalas que pouca gente sabe: eles nunca bebem água! Sabem porquê? Porque eles retiram toda água de que necessitam da própria folha do eucalipto. Na verdade, eles são os predadores número hum dos eucaliptais australianos. Mas, perguntarão alguns, o que isso tem a ver com a gente e com a realidade brasileira e sul-mato-grossense? Já que não existem coalas por aqui os eucaliptais locais estão a salvo de seus principais predadores e poderão então ser utilizados, tanto na fabricação de papel e celulose na superfábrica que está sendo implantada em Três Lagoas, quanto como carvão vegetal nos alto-fornos da siderúrgica MMX (agora, por questões ambientais, embargada pelo Ministério Público Federal (MPF) – finalmente!) que deverá produzir ferro-gusa a partir do minério de ferro extraído das minas de Corumbá. A questão que se coloca, portanto, é inversa daquela que ocorre na Austrália. Lá se preserva o eucalipto para se manter uma população de coalas (predadores naturais), a fim de satisfazer a indústria de turismo local. No Brasil e em Mato Grosso do Sul, os eucaliptais e os grupos econômicos que os exploram (neopredadores), vêm se expandindo em demasia, e ameaçando outras culturas tradicionais, inclusive a pecuária extensiva de corte, além de provocar danos ambientais que só poderão ser enxergados lá na frente. Em Água Clara, MS, por exemplo, são mais de 100 mil hectares de eucaliptos plantados e é de se esperar que nos próximos anos haja uma expansão desmesurada no sentido centro, leste e norte do Estado, com prováveis e sérios danos ambientais ao frágil ecossistema do cerrado brasileiro e também ao pantanal. Como diz o advogado e Professor João José Sady, em artigo da revista Consultor Jurídico, de 27/03/06: “as florestas exóticas de eucalipto eliminam a biodiversidade nativa porque competem pelos nutrientes, ressecam o solo pelo seu uso intenso de água (daí porque os coalas retiram toda a água de que necessitam das folhas do eucalipto) e afastam a vida selvagem. São florestas silenciosas pela ausência de qualquer tipo de fauna que se dispersa em razão da venenosidade de suas folhagens”. No plano social, segundo o Dr. Sady, “O artigo 186 da Constituição Federal (CF) estabelece que a propriedade rural cumpre a sua função (social) quando, entre outros requisitos, além de atender à ‘preservação ambiental’, é ‘exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores”. “No caso, o bem-estar dos trabalhadores rurais está sendo atingido pela amplidão da monocultura do eucalipto, da mesma forma que o bem-estar dos coalas (na Austrália) foi atingido pela redução da presença dessa árvore. Diferentemente dos marsupiais, contudo, o trabalhador rural escolhe – ou, pelo menos, deveria – (acréscimo nosso) influir no seu próprio destino”. E assim, diz ele, “cada vez mais, vamos ver o campo transbordar em conflitos de barbárie, na medida em que a ordem jurídica não dá resposta a este tipo de desafio”. Precisa acrescentar mais alguma coisa? * Hermano de Melo, Escritor. hermelo@terra.com.br

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