Arnaldo Jabor
Toda semana surge um novo artigo apócrifo, com meu
nome... Toda hora um idiota me copia e joga na rede. Há vários; em geral
sobre mulheres e amor. Um deles diz coisas como: "a mulher tem um
cheirinho gostoso, elas sempre encontram um lugarzinho em nosso ombro."
E outro: "adoro celulite... qual é essa de bundinhas duras? Bunda
mole é bonito". No dia seguinte, na rua, fui abordado por uma senhora
fina que me declarou arquejante de orgulho: "Eu tenho bunda mole!" E
saiu andando, em doce euforia.
Sou amado pelo que não escrevi. Há um site em que contei 23 artigos
falsos, com meu nome. Não há como escapar; o ladrão tem vielas para
fugir com a galinha, mas da internet você não se livra.
Por isso, resolvi escrever um artigo apócrifo de mim mesmo. Se puserem na web, eu direi que não é meu. Vamos a isso.
A mulher precisa do homem impalpável, impossível. Gosto do olhar de
onça, parado, quando queremos seduzi-las, mesmo sinceramente, pois elas
sabem que a sinceridade é volúvel. Um sorriso de descrédito baila nas
lindas bocas quando lhes fazemos galanteios, mas acreditam assim mesmo,
porque querem ser amadas, muito mais que 'desejadas'. O amor para elas é
um lugar onde se sentem seguras. E todas querem casar.
O termômetro das mulheres é: "estou sendo amada ou não? Será que ele
me ama ainda?" A mulher não acredita em nosso amor. Quando tem certeza
dele, para de nos amar. Nelson Rodrigues me contou: "Uma mulher me
disse: quando um homem me diz 'eu te amo', perco o interesse na hora".
Elas estão sempre um pouco fora da vida social, mesmo quando estão
dentro. Podem ser executivas brilhantes , mas seu corpo lateja sob o
terninho.
As mulheres têm uma queda pelo canalha. O canalha é mais amado que o
bonzinho. Ela sofre com o canalha, mas isso a justifica e engrandece,
pois ela tem uma missão amorosa: convencer o canalha que ele a ama, mas
não sabe... Mulher não tem critério; pode amar a vida toda um vagabundo
que não merece ou deixar de amar instantaneamente um sujeito devoto. Se
você for realmente mau, saiba que isso é bom e lhe faz respeitado de
forma oblíqua: "Meu marido é um canalha!" - geme a mulher para as
amigas, com um tênue sorriso de orgulho. E as amigas suspiram,
invejando-a pelo adorável canalha que a maltrata.
Como são amados os
malandros... O fiel não tem graça. É tedioso, está ali para sempre,
enjoado, sem drama. O canalha é aventureiro, malvado, encarna um sonho
intangível para a mulher. Todo galã é impalpável.
Por outro lado, é preciso muita atenção para saber se a mulher te ama
mesmo. Outra vez, o Nelson, que fez um teste infalível: "Ou a mulher é
fria ou morde. Sem dentada, não há amor possível."
Nada mais terrível que a mulher que cessa de te amar. Você vira uma
espécie de 'mulher abandonada'. O homem abandonado se efeminiza em
lágrimas vãs. A mulher instila medo no coração do homem. Mesmo com as
carinhosas, há perigo no ar. A carinhosa total entedia os machos, que
ficam claustrofóbicos. O homem só ama profundamente no ciúme.
Só o corno
conhece o verdadeiro amor. Mas, curiosamente, a mulher nunca é corna,
mesmo abandonada, humilhada. A mulher enganada ganha ares de heroína,
quase uma santidade. É uma vingadora, até suicida. Mas nunca corna. O
homem corno é um palhaço. Ninguém tem pena do corno. O homem só vira
homem quando é corneado. A mulher não vira nada nunca. Como no
homossexualismo: a lésbica não é veado. O homem é pornográfico; a mulher
é amorosa. A pornografia é só para homens.
O maior mistério do mundo é a diferença entre os sexos. Por mais que
queiramos, nunca chegaremos lá: o mistério de ter ou não ter pau, o
mistério gozoso de dar, o mistério de ver o mundo de dentro de um útero.
Há alguns exploradores, os travestis, escafandros que tentam mergulhar
fundo neste mar e que voltam de mãos vazias. Nunca saberemos quem é o
outro, aquele ser com seios, vagina, aquele ser ali, maternal, bom,
terrível quando contrariado; e elas nunca saberão o que é um falo
pendurado, um bigodão, um jogo de porrinha, um puteiro visitado.
Se o amor como resposta deixa a desejar, é porque ele aspira
secretamente a matar o outro. O amor aspira a abolir a diferença. Se o
amor se contentasse com pouco, ele não deixaria tanto a desejar. O amor é
uma patética falta de recursos.
Daí, o ódio que os primitivos cultivam contra as mulheres; daí, os boçais assassinos do Islã apedrejando-as até a morte.
As mulheres são sempre várias. Isso não as faz traidoras; nós é que
nos achamos "unos". Só os autoconfiantes são traídos. Esta é uma das
razões do sucesso das putas. O que buscamos nelas? Os homens pagam para
que elas não existam. O amor exige coragem. E o homem é mais covarde.
Elas ventam, chovem, sangram, elas têm inverno, verão, "t.p.m."s,
raiam com a manhã ou brilham à noite, elas derrubam homens com
terremotos, elas nos fazem apaixonados porque nelas buscamos um sentido
que não chega jamais. Elas querem ser decifradas por nós, mas nunca
acertamos no alvo, pois não há alvo, nem mosca.
A mulher quer ser possuída em sua abstração, em sua geografia
mutante, a mulher quer ser descoberta pelo homem para se conhecer.
Querem descobrir a beleza que cabe a nós revelar-lhes. As mulheres não
sabem o que querem; o homem acha que sabe. O masculino é o certo; o
feminino é insolúvel. A mulher é metafísica; homem é engenharia. A
mulher é muito mais exilada das certezas da vida que o homem. Ela é mais
profunda que nós. A mulher deseja o impossível - esta é sua grande
beleza. Ela vive buscando atingir a plenitude, mesmo que essa
"plenitude" seja um "living" bem decorado, um lindo abajur ou o perfeito
funcionamento do lar.
Vejam o resultado. Muitas mulheres adoram os artigos que 'não'
escrevi. Mas, aposto que este será chamado de machismo politicamente
incorreto. Cartas para a redação.
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