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sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A próspera Huaxi


Uma nova imagem surgiu no interior da China, destoante do restante da região,  no leste: um arranha-céu mais alto do que qualquer edifício de  Londres ou  Tóquio com o que se parece com um gigantesco disco de ouro em seu topo. A supertorre de 328 metros, que se eleva das planícies de Jiangsu como um troféu sobre uma prateleira vazia, será inaugurada sábado na aldeia de Huaxi, uma comunidade ao estilo comunista, com uma população fixa de apenas 2.000 "agricultores".


Erguida bem alto durante um período de crise econômica, a megatorre será anunciada como o mais recente símbolo da extraordinária expansão econômica da China. Mas esta bizarra novidade na paisagem também diz muito sobre as questões fundiárias, ambientais, desigualdade e sobre os investimentos acelerados que ameaçam o crescimento do país a longo prazo.

O arranha-céu será utilizado principalmente como salão gastronômico e hotel de luxo. Embora muitos dos que vivem sob a sua sombra ganhem menos de US$16 por dia, não se tenta esconder a brutal diferença entre pobreza e riqueza. Desde uma recepção revestida de ouro até um 60º andar incrustado de ouro, o prédio transpira riqueza e ostentação. Sua característica mais excêntrica é uma estátua de boi, em ouro puro, que pesa uma tolenada, com valor estimado em US$49 milhões.

Mas as grandes cifras não param por aqui. Com 826 quartos e restaurantes para 5.000 hóspedes – inclusive o maior salão de banquetes do sul da China – há espaço quase suficiente para acommodar e alimentar toda a população original do local de uma só vez.


A construção foi idealizada por Wu Renbao, o propulsor por trás da transição de Huaxi, ao longo de 40 anos, de uma pequena aldeia para um conglomerado multibilionário com interesses nos ramos empresariais do aço, de estaleiros, tabaco e têxtil. Alternando os papeis de ditador comunista, empreendedor capitalista e guru da autoajuda, o ancião de 84 anos é um dos personagens mais vistoso da China. Ele é enaltecido por ter transformado Huaxi em uma das mais ricas aldeias da China e por ter levado os moradores originais ao enriquecimento através do pagamento anual de dividendos, distribuição de ações e presentes como viagens internacionais gratuitas. Mas ele é também criticado, por ter transformado a comunidade em um feudo familiar, no qual os trabalhadores não têm férias, enquanto seus parentes ficam com os melhores cargos.

Alguém já não viu esse filme antes?


Ele criou uma hierarquia amplamente baseada na proximidade com o clã Wu. Os membros e descendentes das 2.000 famílias originais de Huaxi estão no tipo da pirâmide. A seguir vêm os 35.000 moradores das aldeias vizinhas, engolidas pela expansão de Huaxi. E na base da pirâmide ficam os 20.000 migrantes recém-chegados, que fornecem mão de obra às fábricas, em turnos de 12 horas, sem descanso semanal. Os salários de US$490 mensais são maiores do que a média recebida por trabalhadores sem grande qualificação na China, mas não chegam a ser nenhuma maravilha.

Wu é, sem dúvida, o grande trunfo de Huaxi. Grandes contingentes de visitantes – a maioria grupos e aposentados – comparecem à palestra das que ele dá diariamente às 10h30, em um auditório local, reformado para ficar parecido com o Grande Salão do Povo, de Pequim. Sua ligações estreitas com o governo central garantem a ele políticas de apoio – por exemplo, a permissão de construir um edifício de 72 andares em uma região onde o prédio mais próximo e maior tem menos de 20 andares. Wu diz ter se inspirado nas megacidades do Oriente Médios. "Esta torre é ideia minha," diz o patriarca com um sotaque local que obriga o intérprete a recorrer a outro intérprete, local. "Nós aprendemos com Dubai, mas, levando em conta a situação doméstica, decidimos que a altura deveria ser 328m. Por que 328m? Porque esse comprimento é igual ao do maior edifício de Pequim." A cultura chinesa carrega de significado os números: 32 é associado aos negócios, e o 8  representa a prosperidade.


Como as autoridades locais também assinalam em um convite para a cerimônia de inauguração: "Existem 209 países que não têm um prédio dessa altura." Inclusive o Reino Unido.

Mesmo quem está acostumado à escala e velocidade das mudanças na China fica impressionado.

A comparação com a era Mao, embora apelativa, está explícita no museu local, onde filmes da velha propaganda msotram agricultores quebrando pedras, trabalhando nas colheitas e vivendo em pequenas casas sem mobília. está evidente também no pequeno parque, que conserva a primeira fábrica de Wu, um prédio caiado de um só andar.


"Wu discursa dizendo que a vida era dura, que todos moravam em barracões com telhado de palha, sem nada nos bolsos, um discurso que poderia ser adaptado como uma retórica em favor do crescimento do PIB. "Eu acredito que nunca será inapropriado promver a expansão da economia e tornar ricas as pessoas comuns do nosso povo. Em nossa opinião, essa é a prioridade."


Essa abordagem funcionou durante décadas e nunca tanto quanto nos sete últimos anos, quando as vendas de Huaxi quintuplicaram. Mas o arranha-céu é um grande indicador de que o estilo tradicional de negócios não mais funciona. O investimento de  US$570 milhões destina-se a atrair turistas e novos negócios para Huaxi quando a aldeia tenta dar um salto, transformando-se de centro industrial poluído em um uma economia se serviços, ecologicamente correta.


Ao fazer a transição de aldeia do terceiro mundo para o arranha-céu de primeiro mundo, Huaxi é, sob muitos aspectos, um microcosmo da China. Mas a próxima etapa será mais difícil, quando a cidade  tenta lidar com a queda na competitividade de suas principais fábricas, o custo da terra inflacionado e as preocupações com o meio ambiente. Nesse caso, uma comparação até mais ampla pode ser feita: como a economia global, Huaxi pode estar dando de cara com os limites do crescimento.

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