José
Nêumanne
Depois
de mandar repórter que o contrariou “se tratar”, presidente conta a
beneficiários do PAC 2 que vitória de Dilma nas urnas estava em seu “programa
de governo”
As
pessoas comuns costumam despedir-se de suas casas ou de seus empregos esvaziando
gavetas, uma espécie de rito de mudança. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
parece ter preferido fazer uma despedida original, inusual. Resolveu abrir o
jogo ou, com o devido respeito, “soltar a franga”.
Quando
Leonencio Nossa, repórter aqui da casa, lhe perguntou se uma visita em que o
acompanhava pelo Maranhão significava uma homenagem dele ao excelente aliado que
sempre foi o chefe do clã Sarney, representado no Estado pela filha governadora,
Roseana, Sua Excelência não se fez de rogado. Primeiramente, mandou o jornalista
que havia ousado abordá-lo sobre um tema delicado “se tratar”.
Com isso, na
certa sem querer, ressuscitou uma das mais brutais instituições antidemocráticas
do século 20, o Arquipélago Gulag, nome tornado célebre no mundo inteiro pelo
russo Alexander Soljenitsin, prêmio Nobel da Literatura, para definir a miríade
de clínicas psiquiátricas em que eram internados dissidentes do regime
soviético. A ousadia de desafiar o dogma do Partido Comunista da União Soviética
era considerada perda da razão e passava a ser tratada por psiquiatras.
Na
democracia lulista, temerários interlocutores que desafiam o amém ao chefe têm
dois privilégios em relação às vítimas do camarada Josef Stalin: não correm o
risco de levar um tiro do comissário Laurenti Beria na nuca e são aconselhados a
procurar psicanalistas: a temeridade de discordar, na União Soviética da alçada
do francês Charcot, aqui passou para os domínios do austríaco
Freud.
Naquela
viagem aos domínios de José de Ribamar, Lula adotou outro conceito
antidemocrático, que esteve em voga em meados do século passado, ao advertir que
um dirigente eleito passa a ser uma instituição, assim como Chico Xavier
incorporava o espírito de Emanuel. Essa prática, definida como culto à
personalidade, foi adotado pelos maiores assassinos do século 20: Hitler,
Mussolini, Stalin, Mao Tsé-Tung e seu amigo Fidel Castro. Instituições
democráticas são impessoais.
Não
é, então, de estranhar que ele, depois, tenha declarado ser a “encarnação do
povo brasileiro”. E se dado ao luxo de incorporar a seu programa de governo a
campanha vitoriosa de sua favorita Dilma Rousseff à própria sucessão.
Trata-se
de uma celebração que encerra uma confissão: feita ante prefeitos e governadores
contemplados com o PAC-2, a afirmação dá conta do segundo passo dado por Lula
para garantir o triunfo eleitoral da petista: depois da compra dos votos dos
pobres pela Bolsa Família (como constatou Ferreira Gullar), ele cooptou os
líderes locais, goleou os tucanos nas urnas e correu para a
galera.
Jornalista
e escritor, editorialista do Jornal da Tarde

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