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domingo, 28 de outubro de 2007

Diário de uma jornalista ameaçada

Lydia Cacho, jornalista mexicana, vive sob proteção policial em Cancún, México, ameaçada durante os dois últimos anos por homens influentes da política e dos negócios, por sua revelação de uma ampla rede de pornografia infantil e lavagem de dinheiro, que implica gente graúda dos círculos do poder.
A figura mais sórdida de Cancún, badalado pólo turístico do México, foi desmascarada por ela. O caso de Lydia atravessou as fronteiras nacionais e recebe a solidariedade e apoio de organizações de direitos humanos e artistas de todo o mundo.Mas sua denúncias foram abafadas pelos principais meios de comunicação mexicanos. Edith foi a primeira vítima a acusar um empresário libanês de violá-la desde os treze anos.
Não é comum ver uma jornalista cercada de seguranças, não obstante os perigos que correm em vários países, e exemplos não faltam: Danny Pearl foi assassinado no Paquistão, quando investigava a Al Qaeda, e também a repórter russa Anna Politkovskaya, crítica do presidente Vladimir Putin, em Moscou. No México, dezenas de jornalistas desapareceram. Lydia Cacho está há tempos no olho do furacão, foi vítima de calúnias e ameaças, além de ações judiciais, uma detenção ilegal, ordenada por gente das altas esferas, e de um atentado frustrado.
Lydia foi convidada de um programa de TV chamado reporte 13, da TV Azteca, que foi gravado mas jamais levado ao ar. Os responsáveis pelo canal disseram conhecer a história de Lydia e não era conveniente falar sobre o assunto. E assim ocorreu com outros programas e emissoras, tendio havido até a desculpa de falta de estúdio para gravar sua entrevista. O veto a Lydia adquiriu uma tonalidade grosseira na entrega do Prêmio Nacional de Jornalismo, onde Cacho era jurada, mas sua imagem não foi mostrada em nenhum momento.
Tudo isso Lydia resolveu contar no livro Memórias de uma infâmia (Editora Mondadori), em fase de impressão. Ela diz que escreveu o livro para que não prevaleçam, como sempre, as versões dos poderosos, que sempre saem ganhando. Sua história deverá virar filme, talvez com Jodie Foster ou Angelina Jolie.
O festival de documentários DOCS, no México, destacou o filme Os demônios do Éden, baseado em outro livro de Cacho, publicado em 2005, que desatou o escândalo. Por ele, os mexicanos conheceram a figura de Jean Succar Kuri, libanês de 63 anos, radicado no México desde a adolescência, provavelmente de maneira ilegal. Homem de contatos influentes, fez bons negócios como testa de ferro em Acapulco, nos setores comercial e hoteleiro.
Mas a figura de homem de sucesso escondia uma personalidade perversa, um maníaco fascinado por meninas no início da puberdade, às quais oferecia dinheiro para que se deixassem tocar e fotografar com ele. "Muitos dos amigos de Succar não sabem que suas filhas, hoje adultas e bem casadas, foram suas vítimas", diz Lydia. Por mais de duas décadas, Succar Kuri explorou sexualmente quase uma centena de meninos e meninas, na mais absoluta impunidade.A Procuradoria Geral da República mencionou a existência de uma rede de pornografia infantil, relacionada ao crime organizado, mas o maníaco não se preocupou com o fato, pois priva de amizades poderosas, como o ex-presidente José López Portillo, entre outros.
Edith Encalada foi a primeira vítima a denunciar o empresário por sua violação,desde os 13 anos, de sua irmã de 8 e prima de 9. Ela afirmou que Kuri tinha contato com garotas americanas que oferecia a seus asseclas Kamel Nacif e Alejandro Góngora. Com a ajuda da procuradoria, Edith armou uma cilada para Kuri, que foi filmado em sua companhia e contou uma de suas repugnantes façanhas, que não convém descrever aqui.
A procuradoria mostrou à imprensa o material gravado, mas Kuri fugiu. Sobrou para a vítima, que foi ameaçada, e Lydia a acolheu no Centro Integral de Atenção à Mulher de Cancún (CIAM), criado por ela para amparar vítimas de violência. Claudia Fronjosá, psicóloga da instituição, relatou que as vítimas chegavam com grande sentimento de culpa, porque Kuri lhes dizia que estavam com ele porque queriam. Duro para meninas, vindas de famílias desintegradas, sem a figura do pai.

Lídia conseguiu trabalho para Edith, que, aos 21 anos, em 2003, acabou cedendo às ameaças dos advogados do libanês, caiu de novo na rede e desapareceu, para surgir novamente em 2005, defendendo Kuri e atacando Lydia Cacho. Todas as outras jovens da rede de pornografia infantil se retrataram ou simplesmente desapareceram. Mas Succar Kuri acabou sendo detido no Arizona e extraditado para o México, onde se encontra em um presídio para criminosos de alta periculosidade.

Mas a represália de seus amigos do submundo dos negócios não demorou: em dezembro de 2005, por ordem Mario Marín, governador do Estado de Puebla, um dinossauro político do PRI, dez policiais à paisana a detiveram, sem ordem judicial e fora de sua jurisdição. Seus colegas difundiram rapidamente a notícia de sua prisão ilegal, e os policiais, que pretendiam jogá-la no cárcere das presas mais violentas no Presídio Oriente de Puebla, desistiram.

Mario Marín "El gober precioso", como é tratado carinhosamente por Nacif, tornou-se uma das figuras mais desacreditadas da política mexicana durante a campanha das eleições presidenciais de 2006. Lydia Cacho apresentou queixa contra o caudilho de Puebla e outros políticos, na Corte Suprema. Pela primera vez, o processo de um cidadão contra um governador está no mais alto tribunal do México, que determinará se há elementos para processá-lo. Mesmo assim, o Congresso terá de autorizar o tribunal a fazê-lo.
Será uma luta desproporcional, pois Miguel Ángel Yunes, ex subsecretário da Segurança Pública Federal, está na Pasta da Seguridade Social no governo de Felipe Calderón; contra ele pesam as acusações das meninas, e também aparece em vídeos com menores, mas não há, ainda, nenhum processo judicial contra ele.
Emilio Gamboa Patrón, ex senador, é líder do poderoso grupo parlamentar do PRI na Câmara dos Deputados, e também não figura em nenhum processo ou investigação, apesar de aparecer em um vídeo com o governador Marín, no qual combinam uma manobra conjunta sobre a Lei do Jogo. Há várias acusações contra este político poderoso, especialmente em Yucatán, seu Estado natal.
Kamel Nacif é, segundo Lydia Cacho, o capo di tutti capi. Tampouco ele responde a processos na Justiça. É o empresário todo-poderoso, que extorque os governadores de Chiapas, Veracruz, Puebla e os antiguos caudilhos de Quintana Roo e Guerrero, que negocia a entrega de um cheque com o bispo Chedraui, com o senador Gamboa...".

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