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quinta-feira, 26 de abril de 2007

O exemplo de Rosa Parks

Rosa Parks, cidadã americana, morreu ano passado, aos 92 anos. Pessoa extraordinária, que lutou e sofreu por uma causa, não se conformou como a vasta maioria e por isso se destacou, o que foi apenas uma conseqüência do seu ato; ela só buscava a sua liberdade e dignidade. Há 50 anos, vigia no Estado do Alabama, EUA, uma lei segregacionista que estabelecia que pessoas negras deveriam ceder seus lugares nos ônibus às de pele branca (e alma nem tanto). Corria o ano de 1955 e Rosa viajava num coletivo, quando um homem branco mandou que ela lhe cedesse seu lugar, mas ela recusou-se, sabendo das conseqüências de seu ato para si, mas talvez sem vislumbrar o bem e a revolução que aquele ato de rebeldia iria causar. Tinha 42 anos e foi presa em virtude de seu ato, mas também involuntariamente, entrou para a história, ao decidir que a sua liberdade valia mais que qualquer coisa, e que a lei que estava infringindo não era exatamente uma lei, mas um ato de exceção, um atentado contra a cidadania, termo que naquele tempo nem era empregado, se é que existia. Chegou a ponto de dizer “chega”, pois sabia que tinha o mesmo direto que qualquer outro passageiro. Fez uma revolução sem derramar sangue. Com sua prisão, houve um boicote de mais de um ano contra os transportes públicos, liderado pelo também bravo lutador Martin Luther King. Mas a luta valeu, acabou a segregação racial nos ônibus com a aprovação da lei dos Direitos Civis, em 1964, jogando o racismo, ao menos aquele mais escancarado, à margem da Lei. Talvez hoje estejamos muito acostumados ao estado das coisas, não indignados o suficiente, não tanto quanto aquela mulher franzina e pobre que resolveu dar um basta à abjeção do racismo, tanto quanto pôde. Pagou ainda mais caro por sua atitude, chegou a ser ameaçada de morte e teve de mudar de cidade. Sua recompensa, além do reconhecimento da sociedade e da conquista de seus direitos, veio muitos anos mais tarde, em 1999 quando ela recebeu a Medalha de Ouro do Congresso americano, a mais alta honraria civil. Antes, já havia sido agraciada com a Medalha Presidencial pela Liberdade, em 1996. Martin Luther King, o pastor negro que lutou bravamente ao lado e depois separadamente de Rosa por 14 anos, recebeu o premio Nobel da Paz. Acabou assassinado a tiros por um homem branco, em 1968. King sempre disse: “temos de enfrentar dificuldades”, e isto obviamente é válido para todos, ontem e hoje. Procurou sempre manter vivo o princípio da Declaração da Independência Americana que diz que "Todos os homens são iguais" e conseguiu convencer a maioria dos negros que era possível haver igualdade social. Alguns dias após a morte de Martin Luther King, o presidente Lyndon Byrd Johnson assinou uma lei acabando com a discriminação social, mas de uma certa forma ela continuou sendo praticada veladamente, pois lá como cá no Brasil, dizer que todos são iguais, mesmo estando escrito na Constituição, embute a grande verdade orwelliana de que alguns são mais iguais que os outros. Nelson Mandela, outro cidadão negro, africano como a brilhante queniana Wangari Maathai, ganhou o Nobel da Paz por sua luta contra o odioso apartheid, que na língua africâner significa “separação”, o nome do abjeto regime outrora vigente na África do Sul. Mandela, por ter sido o líder do movimento de resistência à opressão da minoria branca sobre a maioria negra na África do Sul, passou 28 anos preso, tendo sido libertado apenas em 1990, e daí foi presidente do Congresso Nacional Africano. Em 1994, foi eleito presidente da África do Sul, e os negros passaram a ter o direito de votar. Outro combatente do racismo foi Malcolm X, ou El-Hajj Malik El-Shabazz, que justificou a adoção do estranho nome de Malcolm X dizendo que “neste país (EUA), os negros são tratados como animais, e animais não têm sobrenome”. Foi brutalmente assassinado antes de King, em 1965, em Nova York. Estes exemplos de bravura, sofrimento, abnegação e reconhecimento final nos mostram que é duro sair de uma situação há tempos consolidada, como a nossa subserviência aos desmandos dos políticos; pouco mais fazemos do que reclamar. Hoje, no Brasil, não é necessário recorrer à violência para mudar as coisas. Pode parecer simplista, mas parece que o voto nulo é o melhor sinal que a sociedade brasileira pode dar aos parlamentares e governantes. Podemos e devemos, como Rosa Parks ou Gandhi, mudar as coisas pacificamente, através do protesto, como ela fez, e do voto. Não esperemos, todavia, que a sorte nos poupe de alguns sacrifícios.

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